Uma gambiarra pode revelar oportunidades de inovação como ninguém.
Gambiarra e inovação estão ligadas à constância dos jobs. Como assim? Então, jobs estão por aí nas vidas das pessoas (às vezes a muito tempo) e precisam ser feitos. Se eles estão presentes a tempos, as pessoas os fazem antes da existência de uma solução específica, certo? Ou você realmente acha que antes da FedEx não tinha como “fazer um pacote ir do ponto A até o ponto B”? Em outras palavras…
As pessoas sempre deram/dão/darão um jeito de fazer o job.
Percebeu aonde eu quero chegar?
Se não percebeu, não tem problema, vamos seguir…
As pessoas sempre dão um jeito para fazer o job. Então, quando há um produto que faz esse job bem feito, as pessoas utilizam ele. Mas que estão aqui é a seguinte:
E quando não há um produto que faz o job bem feito?
Bom, primeiro a pessoa analisa se o job vale a pena ser feito mesmo. Quem aqui não tem uma tarefa esperando a tempos ser resolvida por que não há uma boa solução? A realidade é que se o job ainda não foi feito e está tudo bem é por que ele não era tão importante assim.
Mas e quando o job é importante não há um produto para ele?
Ah, aí se dá um “jeito”. E às vezes esse jeito é uma gambiarra.
Antes, vou alinhar rapidamente o conceito gambiarra.
Só para que não haja confusões.
Então, quando eu digo “gambiarras” eu me refiro a todo aquele “uso diferente” da solução por parte do usuário, sabe? Quando o cliente usa o produto de um jeito que você não esperava ou, então, para um propósito que você, nem niguém na sua empresa imaginou. Às vezes as gambiarras são compostas por mais de uma solução também, em outras palavras, quando o usuário junta mais de um produto para resolver um job e claramente tem mais trabalho com isso.
E também tudo aquilo que você considerar uma gambiarra. Sim, não é pra ser algo preciso, na dúvida vai em frente 😉
Quando esse “jeito” é uma gambiarra vale a pena olhar mais de perto.
Tudo é uma questão de avaliar bem o que está acontecendo para que a pessoa tenha escolhido fazer gambiarras para resolver o problema. É claro, muitas coisas estão envolvidas nisto e às vezes não há nada muito útil para ser descoberto. Mas esse pequeno risco pode valer muito a pena, afinal cada caso é um caso.
Ah, muito importante, quando eu falo em “pessoas fazendo gambiarras” eu me refiro a clientes do seu produto, clientes da concorrência, clientes que poderiam utilizar a sua solução ou, até mesmo, clientes os quais você ainda está estudando para desenvolver uma solução.
É importante ter em mente que aqui a coisa não é “rocket science”. Eu não tenho como argumentar com fórmulas que levem em consideração o tamanho da gambiarra, o esforço envolvido nela, a quantidade de ferramentas usadas em conjunto ou coisas do tipo. Realmente é tudo muito relativo, mas se for ajudar, há quem diga que quando o comportamento (a gambiarra) foi muito estranha, vale sempre a pena investigar, pois ela pode revelar uma oportunidade para uma alteração inovadora no seu produto ou, até mesmo, um produto completamente novo e inovador.
Para ajudar, eu separei dois exemplos interessantes que me ocorreram. Mas nenhum deles é de algum cliente meu, são sob a perspectiva de usuário mesmo. A seguir, os exemplos.
Gambiarra nas legendas do Youtube.
Eu estava conversando com um colega de trabalho sobre boas apresentações sobre startups no Youtube. Em algum momento da conversa, surgiu a questão de algumas desses vídeos são longos (mais de 30 minutos). E isto dificulta um pouco a nossa vida quando queremos encontrar apenas um trecho desse vídeo que nos interessa.
Eis então que esse meu colega me explica a sua solução (gambiarra) para esse job de econtrar um trecho do vídeo que nos interessa num dado momento:
- Acessar o video (óbvio).
- Clicar na opção “Mais…” que fica abaixo do vídeo.
- Clicar na opção “Transcrição”.
- Copiar a transcrição que o Youtube gera automaticamente (normalmente para as legendas).
- Dar um Ctrl + F informando alguma palavra que você lembra do trecho que procura.
- Ver onde a palavra foi encontrada e identificar o tempo em que ela foi dita.
- Selecionar o tempo identificado no passo anterior.
É uma gambiarra, mas faz o job. Eu confesso que eu nunca tinha pensado nisto. Até então, eu realmente ficava pulando o vídeo e “chutando” onde mais ou menos se encontrava o trecho que eu queria.
Mas o que dá pra tirar de insight dessa gambiarra?
No mínimo, dá para confirmar que existe o job de “encontrar um trecho específico do vídeo”. E a partir daí, dá pra fazer bastante coisa, como, de repente, possibilitar uma pesquisa mais fácil no conteúdo do que é dito num vídeo (eu sou engenheiro de software e sei que isto seria custoso pra caramba, mas se o job for importante, vale a pena). Possibilitar esse tipo de pesquisa seria algo inovador.
Gambiarra em parceria com Neymar Jr.
É isto mesmo, Neymar, o jogador de futebol.
Então, essa aqui na verdade teve uma baita repercussão. Mas em resumo, foi o seguinte, um jovem começou a utilizar o Messenger do Facebook para armazenar links, tarefas, to-do’s, etc. Como ele fazia isto? Ele mandava mensagens para o perfil do Neymar Jr. Simples, não? Esse jovem pensou mais ou menos o seguinte: “eu facilmente colo ali tudo o que quero armazenar e envio, afinal de contas, o Neymar nunca vai ler a nossa conversa, pois ele deve ter uma quantidade absurda de recados nas redes sociais”.
Mas o que repercutiu mesmo foi o fato de quem um dia o jogador acabou lendo as mensagens dele.
Nesse link aqui tem mais detalhes do ocorrido.
Mas o que dá pra tirar de insight dessa gambiarra?
Aqui a gambiarra é ainda mais interessante. Por que isto? Quando pensamos no Messenger, logo de cara podemos supor que o job é “conversar com amigos e conhecidos”. Tudo bem, o job principal é esse mesmo. Mas o que essa gambiarra do jovem nos mostra é um job, digamos secundário para o app de mensagens.
E não pense que isto foi muita criatividade do rapaz e que poucas pessoas fazem esse tipo de coisa. Vários aplicativos de mensagens estão incorporando jobs, digamos, secundários. Uma prova muito forte disto é a startup inovadora, Slack. Aliás, o Slack é um ótimo exemplo, pois embora ele consista basicamente num aplicativo de mensagens, ele faz muito mais e, principalmente, sabe disto.
Eu ainda quero escrever sobre o Slack num post futuro. Deixa um comentário se você tem interesse num post sobre o Slack pra eu ver se há demanda 😉
Fechando o link entre gambiarra e inovação.
Lembra que comentei que as pessoas de um jeito ou de outro vão fazer o job? Então, muitas vezes elas precisam fazer uma gambiarra pra isto. Só o fato de elas terem se esforçado para de algum modo conseguir fazer o job, mesmo sem um produto específico, já pode ser uma primeira validação de que esse job é importante.
E na medida em que você entende esse job (seja ele conhecido ou não por você) através da análise do comportamento inesperado (a gambiarra) de um usuário, você pode ter bons insights para pivotar, alterar ou, então, criar um produto. E se as pessoas faziam gambiarra é porque talvez não houvesse um produto melhor para isto, o que faz a sua solução inovadora.
Para saber mais sobre o assunto.
Eu acredito que o caso das gambiarras vale realmente muito a pena ser observado pelos responsáveis por um produto. Isto, pois elas se encaixam bem no caso de “comportamentos extremos”, assunto bastante explorado e importante. Inclusive, essa é minha dica para dar sequência no estudo das oportunidades de inovação “escondidas” no comportamento dos usuários. Recomendo começar por este texto aqui: “Insights comportamentais são uma mina de ouro para o seu negócio”.
Espero que tenha gostado do post. Ah, estou curioso para ouvir estórias de gambiarras, então não deixe de comentar 😉